Como ficam os contratos de seguros em época de pandemia?
A epidemia de coronavírus vem se espalhando rapidamente pelo mundo, tendo como seu maior aliado o próprio ser humano. Nota-se que nem todas as pessoas infectadas apresentam os sintomas da doença e isso dificulta a sua identificação e aumenta o alcance da sua transmissão.
Diante do alto contágio e grau de letalidade, a Covid-19 foi classificada como pandemia pela OMS – Organização Mundial da Saúde, razão pela qual as seguradoras têm se eximido quanto aos pagamentos de seguros de vida, viagem e seguro de danos, uma vez que entendem que pandemias e epidemias são riscos excluídos das condições gerais de seus contratos de acordo com a orientação da SUSEP – Superintendência de Seguros Privados e Tratado de Schengen.
O Tratado de Schengen é um acordo entre países europeus sobre uma política de abertura de fronteiras e livre circulação de pessoas entre os países participantes. Quase 30 países, incluindo todos os integrantes da União Europeia, exceto Irlanda e Reino Unido, e 4 países que não são membros da UE (Islândia, Noruega, Listenstaine e Suíça), assinaram o acordo de Schengen. No entanto, entre outras obrigatoriedades previstas está o seguro de viagem com cobertura mínima de 30.000 Euros, ou, o equivalente em Dólar para acidentes, enfermidades e repatriação.
A gravidade da pandemia e o pedido de indenização securitária na hipótese de recusa da seguradora, vem sendo muito discutido no judiciário, oportunidade em que é solicitado a aplicação das normas previstas no Código de Defesa do Consumidor, uma vez que mais benéfica do que as cláusulas do contrato de adesão assinado no ato da contratação do seguro.
O impacto desse vírus não para por aí, pois com o cancelamento total ou parcial de eventos de grandes proporções, como: shows, olimpíadas, campeonatos de futebol, até casamentos e eventos particulares geram o pedido de indenizações por danos eventualmente causados, sem mencionar aqui o pedido de lucros cessantes, pelo que os organizadores deixaram de ganhar.
Nesse passo, o seguro que sofre mais impacto neste cenário é o property, porque sua grande função é a proteção de bens e ativos de grandes empresas de infraestrutura, sujeitas a eventos inesperados e que podem ocasionar perdas e danos patrimoniais elevados, tais como: as do ramo hoteleiro e transporte aéreo.
No Brasil se preza muito a relação de consumo, todavia se a relação existente for apenas contratual o caso deverá ser analisado de forma individual, mas devido aos vultosos valores envolvidos há uma tendência que as perdas não sejam cobertas e o caso vá para o litígio.
O seguro tem como objetivo cobrir riscos previsíveis e é com base nesses cálculos que se precifica o valor do prêmio. Portanto, pandemias e catástrofes naturais são coberturas geralmente excluídas das apólices, segundo a Confederação Nacional das Empresas de Seguros Gerais, Previdência Privada e Vida, Saúde Suplementar e Capitalização (CNSeg).
Contudo, recentemente, devido a extensão da pandemia muitas seguradoras vêm efetuando mudanças nas suas apólices, como é o caso da Porto Seguro, que após análise das circunstâncias de calamidade e considerando as dificuldades na realização de diagnóstico preciso, entendem que os eventos de morte devem ser amparados pela cobertura securitária.
O Itaú Unibanco decidiu não aplicar a exclusão da Covid-19 da cobertura de morte em seus seguros de vida. A medida vale para os clientes com contratos em dia e que cumpram as demais condições contratuais.
A Zurich Santander também decidiu indenizar as possíveis ocorrências relacionadas à pandemia para os clientes com apólices vigentes dos seguros de vida, habitacional, prestamista, acidentes pessoais e viagem, embora os produtos excluem a cobertura para eventos dessa natureza.
A BB Seguros decidiu que garantirá, excepcionalmente, o pagamento integral das indenizações de seguro de vida (individual e em grupo) e de seguro prestamista no caso de mortes confirmadas por Covid-19. As indenizações serão garantidas tanto para apólices vigentes quanto para novas contratações desde que os novos clientes não possuam doenças pré-existentes.
O banco digital Agibank lançou, em parceria com a Seguradora Generali, um seguro de vida com cobertura que contempla morte natural e acidental, o que também inclui ocorrências de óbito por Covid-19. A proteção tem baixo custo de aquisição e oferece, sem carência, o valor de R$ 150,00 (cento e cinquenta reais) para compra de medicamentos e consultas de emergência.
A Mapfre afirmou que pagará indenizações em caso de morte decorrente de infecção pelo novo coronavírus, conforme os valores previstos nas apólices de seguros de vida individual e empresarial.
A Previsul Seguradora destacou que flexibilizará as coberturas securitárias de sua apólice para atender a Covid-19, mesmo com o risco excluído nas condições gerais. Entretanto, a empresa alerta que a preexistência da doença continua sendo fator excludente, além de deixa claro que não irá retirar o risco das suas condições gerais e avaliará os casos individualmente.
Projeto de Lei 890/2020
Proposta pelo Senador Randolfe Rodrigues, como medida para evitar que famílias fiquem desamparadas em decorrência de fatalidades causadas pela Covid-19 e para tanto inclui na cobertura de seguros de vida óbitos decorrentes de epidemias ou pandemias.
A proposta acrescenta item ao Código Civil (Lei 10.406, de 2002) determinando que a seguradora não recuse pagamento do seguro, ainda que na apólice conste a restrição, se a morte ou a incapacidade do segurado decorrer de infecção por epidemias ou pandemia.
O Senador afirma que as doenças causadas por epidemias ou pandemias não consistem em custos extraordinários às seguradoras e não fogem das previsões de equilíbrios atuariais ordinárias
Rol com os ramos de seguro mais impactados pelo Covid-19:
D&O (Responsabilidade Civil para Administradores e Diretores) – Sua principal cobertura é garantir a indenização por danos causados a terceiros em consequência de atos culposos praticados no exercício de suas funções. Essas apólices costumam ter cobertura para gerenciamento de crises e despesas de publicidade.
A atuação dos diretores e administradores com relação a ações preventivas do Covid-19, certamente, poderão ensejar um aumento de demandas envolvendo a responsabilização civil e consequentemente maior sinistralidade no D&O.
Eventos – Costuma ter natureza de um seguro de responsabilidade civil, com cobertura para danos causados pelo organizador do evento a terceiros. Existem coberturas acopladas relacionadas a cancelamentos para garantir gastos com publicidade, locação de espaço, contratação de prestadores, as quais podem vir a ser utilizadas, a depender dos termos e condições da apólice.
Responsabilidade Civil Profissional – Garantir a responsabilidade dos danos causados a terceiros em consequência de atos culposos praticados no exercício das funções profissionais. Os ramos de telecomunicações, mídia, ensino e saúde estão mais expostos a questionamentos diante da velocidade de informações da Covid-19.
Interrupção de Negócios – Geralmente previstas em apólices de riscos operacionais, garante o pagamento de lucros cessantes, na maioria das vezes, ligada a um acontecimento que cause dano material ao estabelecimento / propriedade segurado.
Crédito – O seguro de crédito garante o fluxo de caixa da empresa contra inadimplência de seus clientes. Costuma existir um conceito objetivo para a mora e insolvência nas apólices. É inegável a crise econômica oriunda da Covid-19 e o risco de inadimplência a que os credores estão sujeitos, o que poderá impactar na sinistralidade deste seguro e elevar discussões no que se refere a coberturas.
Garantia (Performance) – Muitas empresas já estão começando a sentir dificuldades para o cumprimento de suas obrigações e contratos. Este seguro, via de regra, cobre o cumprimento de obrigações assumidas pelo devedor (tomador) no âmbito de um contrato garantido firmado com o credor (segurado). Por força do normativo regulatório que trata do assunto, as apólices contêm exclusão para casos fortuitos e força maior, mas a doutrina e a jurisprudência oscilam acerca do tema.
Cyber (Riscos Cibernéticos) – Com a maioria das empresas adotando medidas de trabalho remoto diante da Covid-19, aumenta a exposição a riscos cibernéticos, o que fomenta o ramo para novas oportunidades.
Viagem – O cancelamento de viagens e imprevistos de saúde são coberturas fornecidas no âmbito do seguro-viagem. Quanto ao cancelamento, normalmente, as apólices cobrem o impedimento de o segurado iniciar a viagem por motivo de doença, acidente ou falecimento, do próprio segurado ou membro de sua família. Uma vez iniciada a viagem, o primeiro atendimento hospitalar ao segurado costuma estar coberto, resguardadas exclusões específicas para pandemias, conforme Tratado de Schengen.
Vida – Essas apólices costumam cobrir eventos relacionados ao óbito e invalidez do segurado independentemente da causa, mas muitas contêm exclusão expressa para pandemias declaradas por órgãos competentes, como é o caso da Covid-19, todavia são ações juridicamente discutível, em razão da relação de consumo existente.